26.1.07

Boas intenções, maus instrumentos

A plataforma "Não, Obrigado" tem-se dedicado com afinco à pré-campanha eleitoral do referendo da IVG - desde logo, por ter escolhido a nomenclatura "Plataforma", muito mais catita e distinta dos comuns e obviamente inferiores "Movimentos".
No entanto, ainda que as suas boas intenções sejam indiscutíveis - se bem que não sejam comparáveis às desse santo vivo, esse mártir encarcerado, que dá pelo nome de Sargento Luís Gomes -, a "Plataforma" terá cometido dois erros crassos que podem custar caro à sua causa.
Primeiro, porque escolheu um desenho de um bebé sentado, manuseando uma ampulheta, com a legenda "Uff.. Ainda bem que já passei as 10 semanas!" sob um fundo amarelo.
Passando por cima do fundo amarelo (primeiro óbice), diga-se que ninguém que olhe para lá e pense um bocado não repara que:
- ou a ampulheta tem para aí uns 3 milimetros (o que é muito difícil de fazer em matéria de ampulhetas, por causa do tamanho dos grãos de areia) ou o bebé é gigantesco para quem acabou de passar a barreira das 10 semanas;
- pela constituição física do bebé, ele parece ter não só passado as 10 semanas como ir bem a caminho das 100;
- ainda que o petiz tenha completado as 100 semanas, tem raciocínios e onomatopeias muito elaboradas para um bebé que, atendendo à média para essa idade, não faria mais que chorar e, no máximo, dizer papá e mamã.
Pelo andar da carruagem, um destes dias ainda apanho aquele infante a fumar...

O segundo - e mais grave - erro da Plataforma (não me canso de escrever Plataforma...: Plataforma!) - foi o hino que esgalharam para a campanha. A coisa chama-se "Ainda Vale a Pena Viver" e é logo por aí que a ideia se espalha ao comprido: esta não é uma campanha de prevenção do suicídio (se o fosse e eu estivesse deprimido, ainda que não tivesse tendências suicidas, acabava com a minha vida).
Depois, porque a música é... hmmm... qual é o termo técnico?... hmmm... pateta.
A música é pateta.
As vozes não estão grande coisa, o refrão não é suficientemente orelhudo e parece, em geral, música de escuteiro. Uma patetice junta. Ao lado deste hino, o do PSD, escrito por Manuel Dias Loureiro, parece, sonoramente, Radiohead e, ideologicamente, Zé Mário Branco.
O hino de que falo pode ser ouvido ao clicar-se aqui.

Mas não fiquem completamente tristes os compositores do hino e os membros da Plataforma: com esse título e reformulando-se tudo resto, a musiquita pode servir perfeitamente para um futuro referendo sobre a Eutanásia...